Эпизоды
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O poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade escreveu uma “Toada do Amor”.
“E o amor sempre nessa toada:
briga perdoa perdoa briga.
Não se deve xingar a vida,
a gente vive, depois esquece.
Só o amor volta para brigar,
para perdoar,
amor cachorro bandido trem.
Mas, se não fosse ele, também
que graça que a vida tinha?
Mariquita, dá cá o pito,
no teu pito está o infinito.”
Aqui, Drummond é claro ao dizer que “Não se deve xingar a vida.” Concordo que a vida é para ser agradecida e não insultada, mas às vezes um xingamento dá vazão à toda a revolta que temos dentro de nós.
Do quimbundo xinga, xingar é o verbo para expressar raiva, frustração ou desaprovação em relação a algo ou alguém. Em português, existem palavras como insultar e ofender, mas a palavra xingar costuma ser bem mais usual para indicar que alguém usa palavras rudes ou vulgares, como os palavrões, para agredir verbalmente outra pessoa.
A quantidade de xingamentos é infinita porque o ato de xingar é bastante criativo: na raiva, a gente sempre se permite inventar novas formas de ofender os outros.
Apesar disso, xingar pode causar danos emocionais e psicológicos à pessoa que ouve o xingamento, o que gera conflitos e prejudica relacionamentos interpessoais. Em vez de recorrer ao xingamento, é importante buscar formas mais construtivas de lidar com situações difíceis. Uma comunicação assertiva, respeitosa e livre de agressões é a melhor maneira de resolver conflitos e manter relacionamentos saudáveis. -
A fofoca talvez seja um dos hábitos humanos mais naturais que existe. Nem por isso, ela deixa de ser controversa. Tem gente que acha que a fofoca não edifica. E, de fato, ela pode ser perigosa, especialmente quando se trata de uma mentira ou de uma informação compartilhada com malícia. Às vezes uma fofoca é mesmo a divulgação de um detalhe da vida alheia que o outro gostaria que fosse ignorado. Mas esse hábito humano, que pode até não parecer muito edificante, é uma grande argamassa nas nossas construções sociais. Somos seres gregários e a fofoca é a grande ferramenta social que usamos para discutir as ações das pessoas que estão no nosso núcleo e nos núcleos que nos cercam.
Quando crianças, a vontade de partilhar informações é muito nítida. Por isso, muitas vezes, as crianças são vistas como pessoas que “falam demais”. Esse filtro social que permite entender o que pode ser compartilhado e o que não pode, a gente adquire com o tempo. E é com o tempo que a gente também entende onde e com quem podemos fofocar, ampliando nossos laços comunitários. Tão natural para as crianças e tão cotidiana para os adultos, acredita-se que a origem da fofoca se entrelaça com a necessidade de se trabalhar em equipe e de se dividir informações ainda nos tempos em que a caça era a forma que o homem encontrava para obter alimento. Teria sido para que os homens apoiassem uns aos outros na tarefa da caça, compartilhando informações relevantes sobre terreno e presas, que a fofoca teria surgido.
Sobre a sua etimologia, a teoria mais bem aceita é a da professora etnolinguista Yeda Antonita Pessoa de Castro que, em sua tese de doutorado defendida em 1976 na Faculdade de Letras de Lubumbashi, no Zaire, diz que fofoca tem provável origem no quimbundo “fuka” que significa “remexer”. Com décadas de pesquisa sobre a influência de línguas africanas no português do Brasil, o conjunto da obra da professora Yeda é considerado, em todas as partes, como uma renovação nos estudos afrobrasileiros por redescobrir a extensão da influência banta no Brasil e por introduzir a participação de falantes africanos na formação do português brasileiro.
Um sinônimo para fofoqueiro é mexeriqueiro, palavra que também traz a ideia de remexer. A fofoca, que consiste no ato de descobrir uma informação sobre algo ou alguém e posteriormente contar essa informação a uma ou várias pessoas, dá mesmo uma remexida no fluxo de informações e até na vida das pessoas envolvidas na fofoca. Mas parece que ninguém está imune à ela: em algum momento, ou a gente faz fofoca, ou a gente é vítima dela. -
Пропущенные эпизоды?
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Em 1940, Assis Valente compôs, especialmente para a artista Carmen Miranda, a música “Brasil Pandeiro”, um samba-exaltação ao próprio samba e ao povo brasileiro. A canção, que não agradou Carmen Miranda, acabou sendo gravada pelo grupo Anjos do Inferno naquele mesmo ano e se tornou um grande sucesso. Talvez você já tenha ouvido os versos “Brasil, esquentai vossos pandeiros/Iluminai os terreiros/Que nós queremos sambar” em outras vozes, como na regravação de 1972 dos Novos Baianos. “Brasil Pandeiro” é um dos vários hinos do samba, e ele reforça, na sua composição e na sua letra, a importância do ritmo para os brasileiros. Pandeiro, instrumento de percussão, adjetiva uma nação ritmada.
Como abordado perfeitamente pelo jornalista Tiago Rogero no episódio “Chove Chuva” do podcast “Projeto Querino”, a relação entre o negro e a música brasileira é profunda demais para que aceitamos que o samba não tenha seu merecido reconhecimento porque é envolto num racismo sistêmico que sempre coloca expressões da negritude em espaços periféricos. A música brasileira como é jamais existiria sem a influência africana. Surgido no começo do século XX, o samba é a maior expressão cultural negra do Brasil e, possivelmente, a maior expressão musical do Brasil. A música que costuma ser cultuada no exterior como música brasileira não seria o que é se décadas antes o samba não tivesse surgido, original e envolvente. A primeira composição da venerada Bossa Nova, “Chega de Saudade”, é um samba. O samba está na origem da Bossa Nova e ele é o que existe de melhor na nossa música. Ele é resistência, lazer, trabalho. É a vazão ao sofrimento e à criatividade genial do povo negro.
Segundo Deonísio da Silva, em “De onde vêm as palavras: origens e curiosidades da língua portuguesa” a palavra samba vem do quimbundo “semba”, que significa “umbigada”. Umbigada é um movimento característico do samba, que consiste em bater com o umbigo em outra pessoa, geralmente no momento em que se dança em pares. Esse toque pode ser suave ou mais forte, dependendo do estilo da música e da dança. Em outras línguas africanas encontram-se palavras semelhantes a samba indicando danças e cantos.
Nasceu em novembro de 1916, no Morro da Saúde, em versos improvisados numa roda de amigos que teve lugar na casa de Hilária Batista de Almeida, a tia Ciata, uma famosa matriarca do samba no Rio de Janeiro, aquele que é considerado o primeiro samba. A composição e letra de “Pelo Telefone” são de autoria coletiva. Em 1917, Donga gravou a canção pela Casa Edison, uma das primeiras gravadoras do Brasil. A letra de "Pelo Telefone" fala sobre a alegria de se estar em uma roda de samba, e o ritmo tem uma batida característica que é tocada com instrumentos de percussão, como o pandeiro, o tamborim e o surdo.
Um samba utiliza, principalmente, instrumentos de percussão, como o pandeiro, o tamborim e o surdo, mas também o ganzá e o agogô, e instrumentos de corda, como o cavaquinho e o violão. A cuíca, um instrumento que produz som a partir da fricção de uma haste com um pedaço de tecido molhado e da pressão da parte externa do instrumento com o dedo, também é muito característica do samba. A percussão é tão importante para o samba porque, ainda antes da abolição da escravatura, as rodas de dança que os negros faziam costumavam ser puxadas por batuques.
Nos seus primórdios, em uma manifestação aberta do racismo da sociedade brasileira, festividades realizadas pelos negros, como as rodas de capoeira e de samba, eram proibidas pelas autoridades. Mas durante o último século, essa expressão surgida em comunidades de afro-brasileiros em bairros do Rio de Janeiro resistiu a dificuldades e consolidou sua importância para o país.
A importância do samba é tamanha que, além de fazer parte da cultura e da identidade do brasileiro, ele é reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. O Dia Nacional do Samba é comemorado em 2 de dezembro. A data foi escolhida porque foi nesse dia que o compositor de “Aquarela do Brasil”, mais um dos hinos do samba brasileiro, Ary Barroso, visitou, pela primeira vez, a cidade de Salvador, berço e casa de tantos afrodescendentes.
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Link para o episódio Chove Chuva do podcast Projeto Querino: https://projetoquerino.com.br/podcast-item/chove-chuva/ -
Dentro da série “Propostas Curriculares para o Ensino de Português no Exterior”, do Ministério das Relações Exteriores, existe um livro que se chama “Português para praticantes de capoeira”. Nele, a professora Arizângela Figueiredo descreve a capoeira como “uma manifestação artístico-cultural essencial na história do Brasil, que envolve de forma recíproca o jogo, a luta, a dança e a música”. É na Roda de Capoeira, espaço onde acontece o ritual do jogo, que os capoeiristas tocam, cantam e trabalham sua mandinga, que é a habilidade de surpreender o oponente, e sua ginga, que é a coordenação dos movimentos do corpo.
Segundo o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Iphan, “a capoeira é um espaço profundamente ritualizado, congrega cânticos e gestos que expressam uma visão de mundo, uma hierarquia, um código de ética, que revelam companheirismo e solidariedade. A roda é uma metáfora da vastidão do mundo. Com suas alegrias e adversidades. A mudança constante. É na Roda de Capoeira que se formam e se consagram os grandes mestres, se transmitem e se reiteram práticas e valores tradicionais afro-brasileiros.”
A capoeira praticada atualmente tem duas principais vertentes. A Capoeira Angola tem movimentos mais rasteiros e seu principal expoente é o mestre Pastinha. E a Capoeira Regional tem movimentos mais aéreos e seu principal expoente é o mestre Bimba.
Mestre Pastinha disse que as origens da capoeira estão no Quilombo dos Palmares, fruto da necessidade de o povo negro lutar e resistir contra aqueles que ousassem atacá-los. A imagem de Zumbi dos Palmares capoeirista permeia o imaginário popular. No entanto, não há comprovação histórica sobre a existência de capoeiristas no Quilombo dos Palmares e nem mesmo qualquer registro histórico sobre a capoeira antes do século XVIII. Mas não há como se negar que a capoeira é um símbolo da história afro-brasileira.
Com relação a sua etimologia, são duas as teorias sobre a origem da palavra. Uma diz que ela viria do tupi e significaria algo como “mato ralo”, em alusão aos descampados onde se praticava capoeira. A outra teoria diz que capoeira era uma espécie de cesta na qual os escravizados transportavam animais de seus senhores para venda em feiras. Perto das capoeiras, em intervalos de trabalho, essas pessoas praticariam essa arte que é um grande combinado de destrezas da corporalidade.
De crime nacional punido com prisão a arte praticada em mais de 160 países, ela é, sem dúvidas, um dos maiores difusores da cultura brasileira e do português pelo mundo, tendo alcançado o título de Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO em 2014.
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Link para a Proposta Curricular “Português para praticantes de capoeira”: http://funag.gov.br/biblioteca/download/Cartilha%204-DIGITAL.pdf
Link para o Dossiê do Iphan sobre a Roda de Capoeira: http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Roda%20de%20Capoeira%20-%20Patrim%C3%B4nio%20Mundial%20Imaterial%20-%20Brasil%202014.pdf -
Se existe um nome científico no Brasil que praticamente todo mundo conhece, esse nome é Aedes aegypti. O Aedes aegypti é um mosquito transmissor de várias doenças como a febre amarela urbana, a chikungunya, a zika e a dengue.
Em artigo intitulado “Notas históricas e filológicas sobre a palavra dengue”, publicado na Revista de Patologia Tropical da Universidade Federal de Goiás em 1997, o professor e médico Joffre Marcondes de Rezende faz um histórico do uso da palavra que nomeia a doença. Dengue seria uma palavra de origem espanhola, e no Dicionário da Academia Real Espanhola, ela é definida como um melindre que consiste em exagerar sentimentos para se conseguir o que se deseja. Assim, para o autor, o vínculo semântico entre o nome da doença e a acepção de dengue se justifica devido à postura e ao comportamento daqueles que são acometidos pela doença.
Febre alta, dor de cabeça, dores musculares, dor nas juntas e atrás dos olhos, manchas vermelhas pelo corpo e fadiga são alguns dos sintomas da dengue. É normal que o doente fique dengoso, manhoso, procurando receber cuidados.
Ter uma atitude sedutora, com manha, delicada e meiga é ser dengoso. Mas uma outra possível origem da palavra dengo faz com que ela seja vista com significados mais extensos. Uma hipótese diz que dengo vem do quicongo ndengo e significa “doçura, maciez”. Num sentido mais profundo e ancestral dengo é um pedido de aconchego no meio da rotina. Um carinho é um dengo. Um cafuné é um dengo. A palavra dengo também é usada com afeto como um vocativo para se dirigir a pessoas amadas.
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Link para acesso ao artigo do Professor Joffre Marcondes de Rezende: https://revistas.ufg.br/iptsp/article/view/17233/10377 -
Existem algumas palavras que são mais difíceis de serem traduzidas porque não têm um equivalente direto em outros idiomas. Para serem traduzidas, elas precisam ser explicadas. Esse é o caso da palavra cafuné.
O cantor e instrumentista Dominguinhos, em composição de José Abdon, cantou:
“Te faço um cafuné quando tu for dormir
Te dou café quando se levantar
Dou comida na boca, mato a tua sede
Armo a minha rede e vou te balançar”
Fazer um cafuné é uma das maiores demonstrações de afeto da corporalidade brasileira. O cafuné é o substantivo que se usa para o ato de passar os dedos e a mão com delicadeza pela cabeça de outra pessoa. O gesto foi observado por antropólogos no Brasil tanto em comunidades de origem africana quanto em comunidades indígenas, mas não foi possível precisar sua etimologia. Alguns acham que é possível que ela seja de origem indígena. No entanto, considera-se mais provável que ela tenha chegado ao Brasil vinda da África e que ela seja originária de uma das línguas bantas.
O professor e escritor Deonísio da Silva, em “De onde vêm as palavras: origens e curiosidades da língua portuguesa” , indica que a palavra viria do quimbundo kifunate, que quer dizer “entorse, torcedura”. Originalmente o ato de pegar a cabeça de alguém e torcê-la, cafuné teria se atenuado até chegar ao gesto de coçar o couro cabeludo de alguém com delicadeza.
O cafuné é íntimo porque reafirma laços familiares, de amizade e de amor. E ele é leve porque faz adormecer, acolhe, cuida. Onde tem cafuné, tem afeto. -
“Éramos quatro as filhas de minha mãe.
Entre elas ocupei sempre o pior lugar.
Duas me precederam – eram lindas, mimadas.
Devia ser a última, no entanto,
veio outra que ficou sendo a caçula.”
Assim começa o poema “Minha Infância” da poetisa goiana Cora Coralina. Nele, o eu lírico explica que tinha duas irmãs mais velhas, mas que, quando chegou a última, a recém-chegada ocupou o espaço da então caçula. Derradeiro, o caçula é aquele irmão que nunca foi filho único e, por isso, já nasceu precisando desenvolver seu senso de comunidade, dividindo atenção, espaço e objetos.
Do quimbundo kassule, a palavra caçula significa “o último da família”, ou seja, o filho mais novo. Independentemente do gênero ao qual se refere, o mais comum é sempre usar a forma caçula. É claro que no Brasil é possível dizer que alguém é o filho mais novo, mas a palavra caçula é especial porque se opõe ao primogênito com uma ternura única. O seu diminutivo, caçulinha, reforça ainda mais o afeto com o pequeno da família, mesmo quando ele já é grande.
Palavras são indícios que nos permitem conhecer melhor a nossa história, e várias das palavras usadas no Brasil são elementos fundamentais de afirmação de uma cultura tão importante para o país como é a cultura africana. Caçula é assim: sua origem nos relembra nossas origens e o seu uso reforça a importância da cultura negra para o que somos e falamos. Não a usar seria um desperdício. Usar “mais novo” não só não tem a mesma carga afetiva, como também não tem a mesma graça. Por experiência própria, posso dizer que ser a filha mais nova é confortável, pois temos pais mais experientes e irmãos para facilitar os nossos caminhos, mas eu gosto mais da ideia de ser a caçula simplesmente porque é mais fofo de se dizer.
E você? É filho único ou tem irmãos? Você é o primogênito, o irmão do meio ou o caçula da família? -
A língua que falamos no Brasil é diferente do português falado em Portugal. Uma das particularidades históricas do Brasil, que contribuiu para modificar e enriquecer sua cultura, é a fusão de povos tão distintos que se materializou em seu solo. Entre os séculos XVI e XIX houve um intenso tráfico negreiro, a fim de transportar para o país mão de obra escrava. Devido às condições sociais criadas diante da relação de exploração entre brancos e negros, tudo que era próprio de culturas africanas era visto com preconceito.
A língua não está imune ao fenômeno do racismo. Por isso, durante muitos anos, a palavra moleque foi vista como uma ofensa, carregando em si várias acepções negativas e não relacionadas à sua acepção original.
Do quimbundo mu’leke, moleque significa “menino, rapaz jovem”. Por ter sido um modo comum de os negros chamarem seus próprios filhos, a palavra começou a apresentar um significado pejorativo, pois indicaria crianças de má índole, marginais caçadoras de encrenca.
O significado vinculado à ideia de imaturidade, comum aos jovens rapazes, e, portanto, com um caráter mais negativo, é bastante comum. O cantor sertanejo Pacheco e a falecida cantora Marília Mendonça cantaram a canção “Moleque”, cuja letra diz:
“Foi moleque
Tem trinta mas parece uma criança de sete
Foi moleque
Perdeu quem mais te amava
E vai morrer de saudade
Me esquece
Agora pode procurar um bar
Pro cê chorar a minha falta
Quem sabe se eu largar você cresce
Seu moleque”
Mas mais recentemente, tem ocorrido uma reapropriação do sentido de caráter carinhoso e afetivo que a palavra tem na sua origem. Na expressão “Ah, moleque!”, usada para incentivar o feito de alguém, o “moleque” traz a ideia de que ali existe uma pessoa querida, amiga, que fez algo que merece ser enaltecido.
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Link para a música “Moleque” interpretada por Pacheco e Marília Mendonça: https://www.youtube.com/watch?v=Z0etbAuiRF4&t=139s -
Essa palavra, de origem quimbunda, ganhou o mundo. Quando se ouve a palavra zumbi, é fácil pensar em um cadáver reanimado que perambula por aí, agindo de forma muito diferente daquela que agia quando ainda era um corpo verdadeiramente vivo. Do nzumbi, zumbi é, grosso modo, uma figura mística como um duende, um fantasma que vagueia pelas ruas durante a madrugada. Contudo, para um brasileiro, ouvir a palavra zumbi pode o fazer pensar não apenas em um morto-vivo, mas também em Zumbi, o último grande líder do Quilombo dos Palmares.
Segundo a tradição, Zumbi seria neto de Aqualtune, uma princesa congolesa que foi escravizada no Brasil, mas que, fugida, se tornou líder do Quilombo dos Palmares. Assim, Zumbi nasceu livre, mas foi capturado ainda criança e entregue a um padre jesuíta. Batizado, recebeu o nome de Francisco. Aos 15 anos, foi viver no Quilombo dos Palmares, onde abandonou o nome de Francisco e adotou o nome de Zumbi, “aquele que estava morto e reviveu”.
Após as inúmeras expedições e batalhas que culminaram na destruição de Palmares e na morte de Zumbi, sua cabeça foi cortada e exposta em praça pública no Pátio do Carmo em Recife, no estado de Pernambuco. A intenção era a de que se desfizesse a crença da população na imortalidade de Zumbi. Mas Zumbi encontrou um outro gênero de imortalidade, que nada tem a ver com o mundo físico. Zumbi se tornou imortal ao se perpetuar na memória de um povo que conhece a palavra zumbi também como o nome de um guerreiro que resistiu e lutou pela liberdade dos seus.
Pernambucana, uma das bandas mais influentes da história brasileira se chama Nação Zumbi em homenagem a Zumbi dos Palmares. Jorge du Peixe, vocalista da banda por mais de 20 anos, acredita que o nome seja potente pois Nação Zumbi é a Nação Brasil, de Zumbi dos Palmares. Apesar disso, ele também indica que se trata da nação de um povo zumbi, quase acordado, mas não totalmente.
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Link para acesso ao site da Fundação Cultural Palmares: https://www.palmares.gov.br/ -
Culturas africanas se difundiram pelo Brasil devido às contribuições dos milhões de negros escravizados que foram obrigados a construir o país e enriquecer seus senhores durante 300 longos anos, entre os séculos XVI e XIX. Mais da metade de sua história foi marcada pela nítida exploração e pelas evidentes violências contra o seu próprio povo, mas o Brasil que escravizava nunca deixou de ver o Brasil que resistia. No mês da Consciência Negra, o “Palavras do Brasil” começa uma nova temporada que relembra que não foi só nos costumes, na música, nas danças, nas brincadeiras, na religião e na culinária que a presença de negros escravizados ajudou a desenhar o povo brasileiro. A língua que é falada no Brasil também não seria a mesma sem as influências recebidas deles.
O professor e escritor Deonísio da Silva, em “De onde vêm as palavras: origens e curiosidades da língua portuguesa”, indica que em várias línguas africanas, entre as quais o quimbundo, o quicongo e o umbundo, a palavra “lumbu” significa muro. O “kilumbu” seria um território rodeado de muros utilizado como povoação. Ao fugirem de senhores de engenho, encontrar um quilombo permitia que negros até então escravizados começassem a viver uma nova história.
Waly Salomão e Gilberto Gil compuseram uma canção chamada “Quilombo, o Eldorado Negro”, parte da trilha sonora do filme “Quilombo”, de Cacá Diegues, na qual se dizia: “Existiu um Eldorado negro no Brasil”. O Eldorado negro do Brasil ao qual os compositores se referem é o Quilombo dos Palmares. Fundado no século XVI na então Capitania de Pernambuco, hoje estado de Alagoas, Palmares teve, no seu auge, uma população estimada em mais de 20 mil pessoas que viviam da caça, da pesca, da coleta de frutas, da agricultura e do comércio com colonos da região. A prosperidade de Palmares atraiu receio do governo colonial, que estimulou expedições para a sua erradicação. Depois de décadas, o maior e mais organizado refúgio de negros escravizados nas Américas, no qual também viviam indígenas e brancos pobres, chegou ao fim pelas mãos de bandeirantes, homens responsáveis por desbravar o interior do país e encontrar metais preciosos mas que, nesse percurso, também capturavam escravizados fugidos e indígenas para escravizar. Zumbi dos Palmares, o último grande líder do quilombo, foi assassinado no dia 20 de novembro de 1695. Por meio da Lei n. 12.519/2011, o dia 20 de Novembro foi instituído Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.
A palavra quilombola designa ainda hoje os descendentes daqueles que se abrigavam em quilombos para fugir da condição de escravidão.
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Link para acesso ao site do Parque Memorial Quilombo dos Palmares: https://serradabarriga.palmares.gov.br/
Link para acesso à lei que institui o Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra: https://legis.senado.leg.br/norma/584375 -
Sapeca é um adjetivo que vem do tupi sapéka. Sapeca é o que chamamos de adjetivo de dois gêneros. Isso significa que a forma feminina e a forma masculina são iguais. Menina sapeca, menino sapeca. O mesmo acontece com alguns dos sinônimos de sapeca: peralta, serelepe, traquinas. Esses adjetivos costumam ser muito atribuídos a crianças porque têm relação com uma natureza leve, da personalidade de quem ainda não tem maturidade para entender as consequências do que faz. Sem grandes preocupações e responsabilidades, fazer o que se quer só traz diversão.
Mas, afinal, o que significa “ser sapeca”? Uma criança sapeca é aquela criança capaz de fazer gracinhas e bagunça com frequência, sem parar quieta, dando muito trabalho para os adultos ao mesmo tempo em que lhes pode garantir boas risadas.
Já sapecar, como verbo, significa chamuscar, queimar ligeiramente. Pensando nisso, o adjetivo sapeca fica bem visual: o sapeca não para porque parece estar sempre pisando em algo quente.
E você? Foi uma criança sapeca ou não deu tanto trabalho assim? -
O balé “O Grande Circo Místico” foi inspirado num poema homônimo do escritor alagoano Jorge de Lima. Para o balé, do início da década de 80, os compositores cariocas Edu Lobo e Chico Buarque compuseram um clássico dos coros infantis, a “Ciranda da Bailarina”. A canção apresenta a personagem da bailarina como uma espécie quase divina, sem defeitos, problemas e experiências comuns a todos nós, meros seres humanos. Os versos iniciais da canção dizem que:
“Procurando bem
Todo mundo tem pereba
Marca de bexiga ou vacina
E tem piriri,
Tem lombriga, tem ameba
Só a bailarina que não tem”
Do tupi peré’wa, a pereba, também chamada de bereba, é uma ferida, uma erupção cutânea. Podemos dizer, por exemplo, que alguém, depois de coçar o local onde foi picado por um mosquito, ganhou uma pereba. Ou, se essa pessoa tiver sido picada várias vezes, podemos dizer que ela agora está cheia de pereba. Uma espécie de alergia que causa úlceras pela pele também pode ser resumida a algo que deixa alguém todo perebento.
Ter pereba, vez ou outra, é normal. Mas esse fato corriqueiro, que às vezes pode deixar marcas para toda a vida, não atinge a bailarina. Sorte dela viver uma vida sem lidar com essas imperfeições? Ou pobre dela que não tem nenhuma cicatriz da vida para contar história?
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Link para o poema “O Grande Circo Místico”, de Jorge de Lima: https://boni.wordpress.com/2018/04/23/175/
Link para a música “Ciranda da Bailarina”, interpretada por Edu Lobo e Chico Buarque: https://www.youtube.com/watch?v=DP4jqyVGjMM -
Mário Eduardo Viaro, professor livre-docente da Universidade de São Paulo, em “História das Palavras: Etimologia” para o Museu da Língua Portuguesa disse que “estudar etimologia é vasculhar (…) meandros tortuosos da mudança do significado, mas isso deve ser feito com critério e, principalmente, com abonações que atestem as suas afirmações. Isso é difícil de fazer, portanto raros são os trabalhos confiáveis nessa área do conhecimento.”
A palavra maracutaia é uma dessas palavras sobre a qual se ventilam hipóteses etimológicas controversas. Há quem teorize que se trata de uma palavra de origem tupi. Há quem teorize que se trata de uma palavra de origem africana. Há quem teorize que se trata de uma forma espontânea, criada sob a influência da sonoridade da nossa língua popular. Porém, muitas vezes, dar uma explicação etimológica é mesmo dificílimo e o mais honesto é admitir que, pelo menos ainda, não se tem a menor ideia da origem de algumas palavras.
Com relação à palavra maracutaia, sua origem é incerta, mas é certo que o brasileiro tem familiaridade com ela. Do gosto popular, é uma palavra usada para falar de um “negócio suspeito”, de uma “movimentação fraudulenta”. São sinônimos de maracutaia palavras como esquema, falcatrua, mutreta e tramoia.
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Link para o texto do Professor Mário Eduardo Viaro: https://www.museudalinguaportuguesa.org.br/wp-content/uploads/2017/09/Historia-das-palavras.pdf -
Abacaxi, açaí, maracujá, amendoim… A essa altura, acredito que não seja surpresa para você perceber que muitas palavras de étimo tupi nomeiam produtos da natureza que nos servem de alimento. Quando chegaram às terras que hoje constituem parte do Brasil, os colonizadores se depararam com uma realidade misteriosa, cheia de exemplares da flora e também da fauna que lhes eram desconhecidos. Foram os indígenas, já habitantes da região há milhares de anos, os responsáveis por apresentar os nomes de várias plantas e animais aos portugueses. As línguas indígenas têm, portanto, importante contribuição no léxico da língua majoritariamente falada no Brasil. Mas essa contribuição não se limita à esfera alimentícia.
Cutucar é nossa primeira palavra de origem supostamente tupi que não é comestível. Cutucar é um verbo que viria do tupi kutúk’. O significado dele é o de “tocar com os dedos, espetar”. Muitas vezes usamos um cutucão, aplicado não necessariamente com os dedos, para chamar a atenção de alguém que está distraído. É quase como um “Ei, olha aqui.”, mas mais invasivo. No entanto, um cutucão também pode ser usado para provocar alguém, sem fazer nenhum contato físico. “Ele não gostou do que eu fiz e, por isso, passou a noite inteira me cutucando, dando indiretas.”
Uma expressão muito famosa com o verbo cutucar é a “cutucar a onça com a vara curta” especialmente usada antecedida por um “não”, uma vez que é interessante evitar o perigo que cutucar um jaguar com um pedaço de madeira curto pode trazer. Resumidamente, “cutucar a onça com vara curta” significa se colocar em uma situação arriscada, mexendo com algo ou com alguém com mais força ou poder que você. Se for cutucar uma onça, melhor que seja com uma vara bem longa, para dar tempo de correr da fera.
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Link para acesso à reportagem da Empresa Brasil de Comunicação que fala sobre as contribuições de palavras de origem indígena para o português falado no Brasil: https://memoria.ebc.com.br/infantil/voce-sabia/2015/10/palavras-indigenas-nomeiam-maior-parte-das-plantas-e-animais-do-brasil -
No início da década de 1990, o refrigerante Guaraná (uma outra palavra de origem indígena) lançou uma campanha publicitária com um jingle que marcou gerações numa ode à pipoca, a melhor pedida para assistir a um filme, no cinema ou em casa. Um trecho da canção dizia:
"Pipoca na panela
Começa a arrebentar
Pipoca com sal
Que sede que dá"
Do tupi pi’ (pele) e poka (rebentar), pipoca é a pele rebentada, a pele estourada. O poka teria uma origem onomatopaica numa tentativa de reproduzir o barulho do estouro do grão de milho. É notável a semelhança com a formação de pipoca em inglês: popcorn, que significa “milho que estala”.
Num momento auto-ajuda, gostaria de propor uma reflexão que fosse além da etimologia e do significado de palavras da língua portuguesa. A experiência nos mostra que a vida nem sempre é fácil, mas sem as dificuldades pelas quais passamos jamais seríamos capazes de nos transformar. Nós somos como o milho da pipoca. O educador e escritor Rubem Alves uma vez disse que o “milho de pipoca que não passa pelo fogo continua a ser milho de pipoca, para sempre. Assim acontece com a gente. As grandes transformações acontecem quando passamos pelo fogo. Quem não passa pelo fogo fica do mesmo jeito, a vida inteira.” Pipoca nada mais é que o produto dos grãos de milho rebentados no calor do fogo. Como nós, o milho se transforma diante de mudanças.
Do termo pipoca, surgiu o verbo pipocar que, no futebol, figurativamente, passou a ser o ato de um atleta escapar de uma jogada com receio de contusão. A imagem do jogador que pula para fora da jogada é como a de uma pipoca saltando na panela. Podemos dizer que um jogador que pipoca está amarelando, se acovardando.
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Fonte sobre o verbo pipocar: A Origem Curiosa das Palavras, de Márcio Bueno. Ed. José Olympio, 2002. -
Paçoca não é apenas um, mas sim dois pratos típicos da culinária brasileira. Existe a paçoca salgada e a paçoca doce. De origem tupi, pa’soka significa “aquilo que é socado”. Socar nesse contexto tem o sentido de “moer, esmagar, amassar”. Embora muitas pessoas achem que a paçoca é um alimento de origem nordestina, originalmente eram povos indígenas que se alimentavam com a versão salgada dela, feita à base de carne bovina seca desfiada e farinha de mandioca. A carne era socada no pilão junto com a farinha de mandioca, que às vezes podia ser substituída por farinha de milho. Em seguida, ela era temperada com sal e ervas.
Com o tempo, a paçoca se tornou também o alimento levado por viajantes em longas jornadas. Como muitas vezes eles demoravam semanas para chegar a seus destinos, era necessário pensar em uma refeição leve de se carregar e que pudesse ser preparada com facilidade. Essa necessidade fez da paçoca um dos alimentos mais consumidos no país e um dos que rapidamente se popularizou Brasil afora.
Tropeiros, responsáveis por transportar encomendas e mensagens entre diferentes áreas do país, consumiam o alimento. Enquanto responsáveis pela integração entre comunidades e cidades, funcionavam como difusores de conhecimento, informações e mercadorias, tendo sido fundamentais para a circulação da receita no território. A paçoca se popularizou entre outros grupos de trabalhadores que também precisavam de praticidade em suas refeições. Um deles é o de garimpeiros, que a consumiam enquanto buscavam pedras preciosas às margens de rios. A receita foi sendo aperfeiçoada com outros ingredientes e passou, inclusive, a ser industrializada para comércio em escala.
Já a paçoca doce, de amendoim, é um doce tradicional típico da comida interiorana. Ela é consumida especialmente durante os festejos tradicionais que ocorrem nos meses mais frios do ano no Brasil: as festas juninas/julinas. Contudo, a mistura de amendoim, farinha de mandioca e açúcar também é encontrada industrializada, especialmente em formato cilíndrico. Por causa disso, seu consumo é estendido e acaba ocorrendo de janeiro a dezembro. -
No Tratado Descritivo do Brasil, de 1587, o colono português Gabriel Soares de Sousa escreveu que dos "mendobis temos que dar conta particular, porque é coisa que se não se sabe haver senão no Brasil". Esse fruto, não apenas presente em solo brasileiro, mas originário da América do Sul, se desenvolve e amadurece debaixo da terra, nas raízes das plantas. É por isso que uma das hipóteses etimológicas é a de que seu nome vem do tupi ybá (fruto) tibi (enterrado). Contudo, essa não é a única hipótese para a origem da palavra que poderia ser originária de manda-obi, com o significado de “rolo pontiagudo”. Já o acréscimo da vogal “a” no início da palavra teria sido feito pelos europeus ao notarem semelhanças entre o amendoim e a amêndoa.
Achados arqueológicos de mais de 3,7 mil anos fundamentam a utilização do amendoim na dieta dos povos pré-colombianos. O fruto, de casca espessa, contém de duas a cinco sementes, recobertas por uma fina película colorida entre cores como roxo, vermelho e marrom, a depender da espécie. São muitos os produtos feitos com amendoim. Entre os mais populares, estão a farinha, o óleo, a pasta de amendoim e a paçoca. As sementes também podem ser consumidas como petiscos salgados ou em pequenos pedaços em pratos doces. Os grãos de amendoim apresentam alto valor energético, de lipídios e proteínas. Ainda são fonte de minerais, como cálcio, potássio, magnésio e fósforo. Apesar de apresentar muitas vantagens nutricionais, o amendoim também costuma figurar na lista dos alimentos que mais causam reações alérgicas.
Ainda no século XVI, o amendoim foi levado para a China pelos portugueses e passou a fazer parte de vários pratos típicos daquele país, atualmente maior produtor do fruto. Sua produção mundial não é muito grande, mas tem aumentado devido à demanda pela sua transformação em biodiesel. Subprodutos da extração de seu óleo têm demanda na alimentação animal. Refinado, esse óleo é utilizado também pelas indústrias farmacêutica e cosmética. Não refinado, é utilizado como combustível e lubrificante.
O amendoim verde cozido foi reconhecido oficialmente como patrimônio imaterial do estado de Sergipe, localizado na Região Nordeste do Brasil, por meio da Lei 7.682/2013. A legislação assegura a importância cultural desse alimento típico do Estado de Sergipe, mas consumido com gosto por todo o país.
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Link para acesso à lei que torna o amendoim verde cozido patrimônio imaterial do Estado de Sergipe e dá providências correlatas: https://al.se.leg.br/Legislacao/Ordinaria/2013/O76822013.pdf -
Maracujá é a denominação geral dada ao fruto e à planta de várias espécies do gênero Passiflora. Foi ainda no século XVI, nos primórdios da colonização europeia na América do Sul, que as primeiras referências escritas a plantas do gênero Passiflora foram feitas. No Tratado Descritivo do Brasil, de 1587, o colono português Gabriel Soares de Sousa trouxe, em detalhes, traços do Brasil quinhentista, incluindo na obra referências ao maracujá como uma planta exótica com múltiplas potencialidades alimentares, ornamentais e medicinais.
Se algum dia você pensou que o maracujá andou recebendo por aí o nome de “fruto da paixão” porque possui propriedades afrodisíacas, devo dizer que, na verdade, o maracujá é bastante conhecido por suas propriedades nada estimulantes, já que se trata de um calmante natural. Por que então o maracujá acabou ganhando essa fama?
Foi ainda no século XVI que o médico e botânico espanhol Nicolás Monardes fez uma descrição detalhada da planta, permitindo que o historiador italiano Giacomo Bosio fizesse associações das estruturas da flor do maracujá com elementos da paixão, mas a de Cristo. A analogia foi publicada na obra "La trionfante e gloriosa Croce” em 1610. Nela, elementos da flor do maracujá se tornaram representativos dos cravos da crucificação, das chagas e da coroa de espinhos de Jesus e até dos chicotes e das lanças usadas por seus algozes.
Do tupi mboruku'ia, o maracujá é um “alimento que se toma em goles”. Com uma diversidade genética expressiva em suas centenas de espécies, o maracujá pode ser utilizado, de fato, com múltiplas finalidades alimentares, ornamentais e medicinais, como indicado há quase 500 anos no Tratado Descritivo do Brasil.
Mais comumente, com o maracujá se faz sucos, iogurtes, mousses, doces, sorvetes e geleias. Mas, bastante apreciado na gastronomia gourmet, o maracujá é um ingrediente cada vez mais adotado em pratos salgados, sendo base, por exemplo, de molhos para saladas e carnes. A singularidade de suas flores o torna elemento decorativo e paisagístico. Suas finalidades fitoterápicas são voltadas principalmente para problemas relacionados ao sistema nervoso. No entanto, muitas substâncias presentes nos frutos, principalmente na polpa e na casca, contribuem beneficamente para a saúde humana por terem atividade antioxidante e de diminuição da pressão arterial, da taxa de glicose e de colesterol no sangue.
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Link para acesso ao artigo de pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, a Embrapa, para o Programa Cooperativo para o Desenvolvimento Tecnológico Agroalimentar e Agroindustrial do Cone Sul, o PROCISUR: https://www.procisur.org.uy/adjuntos/procisur_maracuja_506.pdf -
Conta a lenda que existia na Floresta Amazônica uma aldeia indígena muito numerosa que atravessava um período de escassez alimentar. Por isso, o cacique Itaki tomou a decisão de sacrificar todas as crianças recém-nascidas, a fim de controlar o aumento populacional. Um dia, a filha do cacique, Iaçá, deu à luz uma menina que precisou ser sacrificada para atender às ordens do avô. Iaçá, desesperada, chorava todas as noites de saudades da criança. Foi quando pediu à divindade Tupã que indicasse ao cacique uma outra forma de ajudar seu povo. Delirante, Iaçá ouviu o choro de sua filha, ao pé de uma grande palmeira. Mas ao tentar abraçar a criança, se deu conta de que não havia ninguém ali. Iaçá morreu de tanto chorar. Seu corpo foi encontrado abraçado ao tronco da palmeira, que carregava vários frutinhos escuros. Itaki mandou que colhessem os frutos para alimentar as pessoas na aldeia e assim poder suspender a ordem de sacrifício. Em homenagem a Iaçá, o fruto recebeu o nome de açaí, seu nome de trás para frente.
Já a etimologia diz que açaí vem do tupi iwasa’i, que significa fruto que chora, que expele água. Fruto da palmeira conhecida como açaizeiro, cujo nome científico é Euterpe oleracea, o açaí é uma espécie nativa da região amazônica, sendo encontrada no Brasil, mas também em países como Venezuela, Colômbia e Equador. Pequena e arredondada, de cor que varia entre o roxo e o preto, o açaí é um alimento muito importante na dieta dos habitantes da Amazônia e seu consumo remonta aos tempos pré-colombianos.
Mais tradicionalmente, o açaí é tomado gelado com farinha de mandioca ou de tapioca, mas as receitas com açaí levam até mesmo peixe assado e camarão. Fora da Amazônia, constantemente o açaí congelado recebe incrementos como frutas e cereais. Suas sementes limpas são bastante utilizadas em artesanatos. -
A infrutescência de nome científico Ananas comosus apresenta um gosto ácido e adocicado. Símbolo de regiões tropicais e subtropicais, a fruta amarela de casca áspera e coroa verde e espinhenta é bastante consumida em diversas partes do mundo. E embora nem todo mundo aprecie pedaços de abacaxi na pizza, a versatilidade da fruta permite seu uso em pratos salgados, mas também em pratos doces. Além disso, ela é usada no preparo de bebidas alcoólicas como a piña colada e não alcoólicas como sucos e vitaminas. Conhecido como ananás em outras bandas, no Brasil, o abacaxi costuma ser consumido também em churrascos, pois, devido à concentração de bromelina em suas fibras, auxilia na digestão de carnes pelo organismo.
Até pouco tempo, era consensual que a palavra fosse oriunda da junção dos termos tupi ybá (fruto) e kati (que exala cheiro agradável), ou seja: fruto cheiroso. No entanto, em artigo intitulado “Reavaliando a etimologia de abacaxi a partir de novos dados histórico-filológicos” publicado na Revista Filologia e Linguística Portuguesa da Universidade de São Paulo em 2020, o professor e pesquisador Bruno Maroneze da Universidade Federal da Grande Dourados indica que a etimologia atualmente consensual deve ser tratada como controversa. Considerando questões fonético-fonológicas e histórico-filológicas, a etimologia consensual é questionada pois a transformação de “ybá-kati” em “abacaxi” não apresenta alternâncias fonéticas prováveis e, além disso, documentos indicam a existência prévia da palavra, datada do século XVII, para indicar um povo indígena já extinto, um afluente do Rio Amazonas localizado próximo a terras desse povo e uma missão jesuíta ocorrida na região.
Na gíria brasileira, abacaxi também significa um “problema”. Considerando a dificuldade que é literalmente descascar um abacaxi, a expressão “descascar um abacaxi” significa “resolver um problema”, “livrar-se de uma situação complicada”.
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Link para acesso ao artigo do Professor Bruno Maroneze: https://www.revistas.usp.br/flp/article/view/166154